Este trabalho apresenta o modo como a Sociedade Brasileira de Psiquiatria, Neurologia e Medicina Legal – agremiação criada em 1907 e importante na institucionalização da psiquiatria no Brasil nas três primeiras décadas do século XX – incentivou e participou dos intercâmbios científicos sobre os saberes que lhe nomeavam. Sabemos da explicita adesão às idéias do psiquiatra alemão Émil Kraepelin por parte de psiquiatra expressivo do período, Juliano Moreira (1873-1933), presidente da referida Sociedade desde sua fundação até 1933. Contudo, a partir da análise do periódico desta instituição e, principalmente das atas das reuniões nele publicadas, observamos que na Sociedade também circularam outros saberes e correntes teóricas que não apenas a teoria kraepeliniana.
De um lado tais intercâmbios propiciavam a difusão das idéias de médicos brasileiros em países latino-americanos e europeus que se fazia por meio, principalmente, da participação em congressos e em sociedades científicas de outros países internacionais, ou com e publicação de artigos em periódicos internacionais. Por outro lado, a apropriação das idéias científicas estrangeiras se dava também por estas atuações; somando-se à leitura de obras nas línguas originais (alemão e francês, principalmente, mas também inglês e italiano), às visitas a universidades e clínicas psiquiátricas européias, e também à visita de médicos estrangeiros ao Brasil: o psicólogo francês George Dumas em 1908, 1917 e 1925; o neurologista alemão Max Nonne (1861-1959), o francês Joseph Babinski (1857-1932) e o português Egas Muniz (1874-1955), que aqui estiveram respectivamente em 1922, 1925 e 1928; ainda em 1928, temos a visita neuropatologista alemão Alfons Maria Jakob (1884-1931), professor de neurologia e chefe do laboratório da Universidade de Hamburgo.
Embora os intercâmbios científicos tenham ocorrido principalmente com os círculos psiquiátricos europeus, eles foram ampliados a partir de 1928 para outros países, como Estados Unidos da América, Canadá e Japão. Como podemos observar as visitas científicas articuladas pela Sociedade propiciaram a circulação, principalmente, das idéias de neurologistas, a partir de 1922. A análise então empreendia permite compreender os modos como os intercâmbios científicos participaram do desenvolvimento e redefinições da ciência psiquiátrica brasileira, produzida e agenciada por seus atores na cidade do Rio de Janeiro.
Ana Teresa A. Venancio, Doutora em Antropologia Social pelo Museu Nacional da Universidade do Estado do Rio de Janeiro; pesquisadora e professora do Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz (Brasil)
Ede Conceição Bispo Cerqueira, Historiadora pela Universidade do Estado da Bahia; mestre pelo Programa de Pós-Graduação em História das Ciências e da Saúde da Casa de Oswaldo Cruz/Fiocruz (Brasil)